Carência

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Autor

Igor MENDONÇA

Data de Publicação

26 de setembro de 2023

2 Forma de comprovação

A carência é um requisito legal exigido para alguns benefícios previdenciários. Quando legalmente exigida, é necessário ter em mente que algumas espécies de segurados possuem contribuições presumidas, haja vista que o recolhimento é feito pela pessoa física ou jurídica a quem se encontram vinculadas. Nesse contexto, possuem contribuições presumidas os seguintes segurados obrigatórios:

  1. empregado;
  2. empregado doméstico, a partir da competência junho 2015 (art. 26, § 4º-A RPS, haja vista a redação dada ao art. 27, I, da LBPS pela EC 150/2015);
  3. trabalhador avulso;
  4. contribuinte individual prestador de serviços a empresa, a partir da competência abril de 2003 (de acordo com a Lei n.º 10.666/2003).

Em tais casos, a carência é comprovada através do exercício da atividade laborativa remunerada pelo número de meses exigido para que o segurado faça jus ao benefício previdenciário pleitado, devendo a Receita Federal do Brasil providenciar a cobrança das contribuições previdenciárias de seus responsáveis (se não passado o prazo decadencial).

Por outro lado, certos segurados devem comprovar o efetivo recolhimento das contribuições relativas ao período de carência do benefício pleiteado. Para estes, o período de carência é contado a partir da primeira contribuição previdenciária recolhida sem atraso. São eles:

  1. o contribuinte individual que desenvolve atividade econômica por conta própria;
  2. o segurado especial que contribui sobre 20% do salário de contribuição (para fazer jus ao benefício de aposentadoria programada, em valor superior ao salário-mínimo);
  3. o segurado facultativo.

Por último, há um caso de dispensa legal de contribuições: o segurado especial não contribuinte (aquele que não recolhe sobre 20% do salário de contribuição) tem seus períodos de carência contados em número de meses de efetivo labor rural, ainda que descontínuos, imediatamente anteriores ao requerimento do benefício previdenciário.

O recolhimento das contribuições previdenciárias alimenta o CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais -, utilizado pelo INSS para apuração dos vínculos e das remunerações dos segurados da Previdência Social. Havendo dúvida, a Autarquia poderá solicitar os documentos que serviram de base à anotação, mas esses registros são, hoje, a principal fonte de informação da Autarquia Previdenciária para a análise de requerimentos de benefícios.

2.1 Comprovação da carência pelo segurado especial (art. 11, VII, e art. 39, I, e parágrafo único, da Lei 8.213/91)

Merece um tópico à parte o estudo da comprovação da carência do segurado especial não contribuinte, em vista de sua especificidade e importância prática.

Conforme já visto, o segurado especial do RGPS encontra-se dispensado de comprovar o efetivo recolhimento das contribuições previdenciárias para fazer jus a certos benefícios previdenciários, no valor de até um salário-mínimo (art. 39, I, art. 39, I, e parágrafo único, da Lei 8.213/91). Para tanto, deve comprovar o efetivo labor rural pelo número de meses correspondente à carência do benefício (se este exigir carência).

É entendimento jurisprudencial pacificado que a regra prevista no art. 55, § 3º, da LBPS aplica-se ao segurado especial, de modo que este deve apresentar início de prova material referente ao período contributivo que pretende contar como carência, não bastando a prova exclusivamente testemunhal.

Súmula 149/STJ. A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.

Porém, não se exige que o início de prova material (ou seja, documental) seja referente a todo o período de carência, podendo sua eficácia ter efeitos retrospectivos ou prospectivos, de acordo com os demais elementos probatórios apresentados. Vejamos:

Súmula 14/TNU. Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício.

Em sentido semelhante, fixou o Superior Tribunal de Justiça:

Súmula 577/STJ. É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.

É necessário que os documentos sejam contemporâneos dos fatos a provar, não sendo admitidos documentos produzidos intempestivamente, apenas com finalidade previdenciária, embora isso seja muito comum na prática:

Súmula 34 TNU. Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar.

O art. 106 da LBPS enumera documentos admitidos como início de prova material. Porém, referida lista não é taxativa, de modo que o juiz pode considerar outros documentos que não os ali mencionados.

3 Períodos de carência

Os períodos de carência encontram-se dispostos no art. 25 da LBPS. A tabela abaixo compila os prazos exigidos para cada benefício vigente no RGPS:

Benefício Carência (em número de contribuições mensais)
salário-maternidade da contribuinte individual, facultativa e segurada especial 10
aposentadoria por incapacidade permanente (invalidez) Em regra, 12
auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) Em regra, 12
auxílio-reclusão 24
aposentadoria por idade do trabalhador rural 180
aposentadoria programada 180
aposentadoria especial 180

Por outro lado, de acordo com o art. 26 da LBPS, independem de carência as seguintes prestações previdenciárias:

  1. o salário-maternidade das seguradas empregadas, trabalhadoras avulsas e empregadas domésticas;
  2. quando provenientes de acidente de qualquer natureza ou causa (inclusive acidente do trabalho, moléstia ocupacional) ou doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, os benefícios de aposentadoria por incapacidade permanente (aposentadoria por invalidez) e auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença);
  3. em qualquer caso, a pensão por morte, o salário-família, o auxílio-acidente e os serviços previdenciários (serviço social e reabilitação profissional).

No que se refere ao item “b”, vigora a Portaria Interministerial MTP/MS nº 22, de 31 de agostro de 2022. Referido ato normativo elenca as seguintes moléstias (art. 2º):

I - tuberculose ativa; II - hanseníase; III - transtorno mental grave, desde que esteja cursando com alienação mental; IV - neoplasia maligna; V - cegueira; VI - paralisia irreversível e incapacitante; VII - cardiopatia grave; VIII - doença de Parkinson; IX - espondilite anquilosante; X - nefropatia grave; XI - estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante); XII - síndrome da deficiência imunológica adquirida (Aids); XIII - contaminação por radiação, com base em conclusão da medicina especializada; XIV - hepatopatia grave; XV - esclerose múltipla; XVI - acidente vascular encefálico (agudo); e XVII - abdome agudo cirúrgico.

De acordo com o parágrafo único do mesmo dispositivo “As doenças e afecções listadas nos incisos XVI e XVII do caput serão enquadradas como isentas de carência quando apresentarem quadro de evolução aguda e atenderem a critérios de gravidade.”

4 Carência na hipótese de reaquisição da qualidade de segurado

A redação original da Lei n.º 8.213/1991, previa uma vantagem para o segurado que readquirisse essa qualidade, após findo o “período de graça” (art. 15, LBPS). De acordo com o parágrafo único do art. 24, havendo perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores a essa data só eram computadas para efeito de carência depois que o segurado contasse, a partir da nova filiação ao RGPS, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício requerido. Dessa forma, por exemplo, o segurado empregado que, contando 10 (dez) contribuições mensais, fosse despedido e somente voltasse a exercer atividade laborativa remunerada após o transcurso da integralidade do período de graça, deveria ter, no mínimo, 4 (quatro) contribuições mensais, a partir da nova filiação, a fim de cumprir a carência necessária para gozar do auxílio-doença (que exige carência de doze meses).

Por seu turno, a Lei n.º 13.457, de 2017 (resultante da conversão da Medida Provisória n.º 767/2017) simplesmente revogou o parágrafo único no art. 24 da LBPS, de maneira que, durante a sua vigência, o segurado que reingressasse no RGPS deveria cumprir a integralidade dos períodos de carência previstos em lei.

Posteriormente, a MP 871/2019, depois convertida na Lei n.º 13.846/2019, passou a exigir o cumprimento de metade dos prazos de carência a partir da nova filiação (art. 27-A da LBPS). Esse é o regime que vigora atualmente. Portanto, no exemplo exposto antes exposto, o requerente deve cumprir, no mínimo, 6 (seis) meses de carência após a nova filiação.

É importante perceber que essa regra aplica-se apenas a alguns benefícios que exigem carência. Nomeadamente, auxílio por incapacidade temporária, aposentadoria por incapacidade permanente, salário-maternidade e auxílio-reclusão. O dispositivo deixa de fora as aposentadorias (exceto a por incapacidade permanente). Para tais benefícios, a perda da qualidade de segurado não afeta o cumprimento da carência, quando exigida.

Reuso

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